quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

EMANCIPAÇÃO FEMININA EM DEBATE

Alteração no local do evento:
Sindpd Pe [Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Informática, Processamento de Dados e Tecnologia da Informação de Pernambuco]
Rua Bispo Cardoso Ayres, 111, Boa Vista, Recife-PE. 
fone: [81] 3421-3818 

sábado, 23 de fevereiro de 2013

"Professor pré-pago"

Recentemente divulguei na página facebook deste blog uma reportagem veiculada pela revista Veja sobre o 'professor pré-pago'. Trata-se de um serviço oferecido pela Apoio Escolar 24 horas. O processo é simples. O interessado compra um cartão, a venda em livrarias, e recebe um código. A partir deste código é possível acessar, via internet, material didático dos ensinos fundamental e médio produzido pela própria empresa, bem como outros textos concebidos por professores e divulgados em sites externos de instituições como a Universidade de São Paulo, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, entre muitas outras. O usuário tem ainda o direito de fazer vinte perguntas mensais (não cumulativas) sobre diversas matérias lecionadas no ensino básico, pelo período de um ano. 

Não resisti. Desembolsei R$ 99,00 e comprei um cartão. Afinal, levando em conta as infindáveis discussões sobre as tendências futuras do ensino a distância, é claro que eu precisava avaliar este serviço. 

No site da Apoio Escolar 24 horas consta que os serviços prestados são ideais para:

1) Pais sem tempo ou paciência para estudar com seus filhos.

2) Estudantes com notas baixas na escola.

3) Famílias que não podem arcar com professores particulares.

Portanto, esta empresa explicitamente se sintoniza com a desarticulação familiar. Afinal, faz parte de seu público-alvo aqueles pais que não têm paciência para estudar com seus filhos. 

Vale observar também que não está previsto o caso do estudante com notas satisfatórias ou boas, mas que gostaria de melhorar seu desempenho escolar.

Logo, a Apoio Escolar 24 horas sugere que seu público-alvo é simplesmente marginal, tanto do ponto de vista escolar quanto social. 

Em relação a conteúdos, avaliei principalmente a disciplina de matemática, com ênfase no ensino médio. Comecei com trigonometria, logaritmos, matrizes, conjuntos e funções. Examinei também alguns conteúdos de física.

De acordo com a Apoio Escolar 24 horas, a função seno é uma função da forma y = sen(x). Já li muito material medíocre sobre trigonometria, mas esta suposta definição para a função seno é certamente a pior que já vi. Afinal, nada foi definido. O autor deste material confunde gravemente conceito com notação. y = sen(x) é tão somente uma notação. De forma alguma isso define seno. Ou seja, a matemática continua sendo lecionada de forma puramente doutrinária e não racional. 

Em seguida aparece na mesma tela uma animação do círculo de raio unitário usualmente empregado para lecionar trigonometria. Este é um recurso típico de multimídias e uma das vantagens enaltecidas pelos adeptos do ensino a distância. No entanto, a animação novamente se sustenta em uma visão distorcida sobre o conceito da função seno em trigonometria, conforme já foi discutido anteriormente neste blog. Não importa se um desenho é impresso em papel ou animado em uma tela de computador, esta velha história de definir seno a partir de mera visualização é simplesmente uma aberração intelectual. 

Já a suposta conceituação de logaritmo é dada através de um exemplo com números inteiros. Em momento algum é esclarecido o domínio de aplicação de logaritmos. Logo, o estudante só pode se sentir perdido diante desta alegada conceituação. Para piorar, em seguida aparece um novo exemplo com a equação "2 elevado a x = 5". Isso sugere que o expoente x pode ser um número real, o que contradiz a bizarra conceituação dada anteriormente. Além disso, fica a questão: como definir 2 elevado a x quando x é um número real qualquer? Isso eu gostaria de ver.

O conceito amalucado de matriz como um quadro formado por linhas e colunas é novamente repetido, como ocorre em tantos livros e apostilas impressas deste país. No entanto, o primeiro exemplo de matriz apresentado tem entradas não numéricas. No lugar de números reais, são apresentadas entradas que são simplesmente nomes de disciplinas, como matemática, biologia e geografia. Fico pensando como se calcula o determinante desta matriz de disciplinas escolares. Portanto, a justificativa inicialmente apresentada para o estudo de matrizes, como é usual na literatura impressa deste país, não está em acordo com a álgebra matricial desenvolvida posteriormente (como adição, multiplicação e inversão de matrizes, entre outras operações). 

Partindo para uma segunda etapa, enviei algumas questões para o atendimento personalizado. 

Seguem abaixo as questões enviadas e suas respectivas respostas. Aproveito para comentar as respostas apresentadas.

Questão 1: Como se calcula o seno de 1,17 graus? Preciso da resposta com precisão de dez casas decimais.

Resposta 1: Você só pode obter esta precisão usando uma calculadora. Mas que aplicação você fará de sen 1,17º no Ensino Médio que demande tal precisão?

Comentário 1: O autor da resposta faz perceber que a calculadora eletrônica opera como uma espécie de oráculo que não demanda justificativa alguma. No entanto, é perfeitamente possível apresentar ao aluno de ensino médio pelo menos parte do processo empregado por calculadoras eletrônicas no cálculo aproximado do seno de quaisquer números reais. Além disso, o autor da resposta analisa a questão única e exclusivamente em termos de aplicações no ensino médio. Ou seja, temos aqui a eterna postura brasileira de justificar o ensino a partir de necessidades impostas pela própria rede de ensino. Matemática do ensino médio, na visão da Apoio Escolar 24 horas, não é útil para aplicações no mundo real. Matemática no ensino médio, para esta empresa, deve ser útil apenas para o próprio ensino médio.

Questão 2: Preciso de um exemplo de um conjunto x tal que todos os elementos de x são também subconjuntos de x.

Resposta 2: O genial Georg Cantor provou que nenhum conjunto X tem a mesma cardinalidade do seu conjunto das partes. Mas esta questão é bastante sofisticada e foge completamente do escopo do Ensino Médio, ok?

Comentário 2: A primeira afirmação não tem relação alguma com a pergunta. E a segunda afirmação é falsa. Segue um exemplo muito conhecido na literatura: x = {0,{0}}, sendo que 0 denota o conjunto vazio (conjunto que não tem elemento algum). Este conjunto x tem dois elementos: 0 e {0}. E cada um desses elementos é subconjunto do conjunto x. Basta utilizar os conceitos de pertinência e de subconjunto, usualmente lecionados no ensino médio.

Questão 3: No site de vocês está escrito que uma matriz é uma maneira especial de apresentar um conjunto. No entanto, um conjunto é definido apenas pelos seus elementos. A ordem em que esses elementos são apresentados é irrelevante. Já na matriz a ordem em que os elementos estão dispostos é importante. Que tipo de conjunto é a matriz? 

Resposta 3: Por definição, dados dois números inteiros positivos "m" e "n", chama-se matriz "m x n" a tabela formada por "m.n" números reais, dispostos em "m" linhas (horizontais) e "n" colunas (verticais). Sobre esta afirmação, preciso saber em que contexto ela apareceu. Em que material do nosso site você a encontrou?

Comentário 3: Aqui o autor da resposta demonstra claramente desconhecer os conteúdos apresentados pela empresa na qual ele trabalha. Além disso, uma matriz pode ser perfeitamente definida a partir da noção de conjunto. Mas não da forma como se apresenta no site.

Questão 4: Vi em alguns livros que número complexo, por definição, é um número da forma a+bi, sendo a e b números reais e i a unidade imaginária cujo quadrado é -1. Mas se o quadrado de i é igual a -1, então i não pode ser um número real. Portanto, como é possível multiplicar i por b? E como somar este resultado com a? 

Resposta 4: Expandimos nosso conceito de número na medida em que os números reais não são suficientes para certas operações. Esta expansão é feita criando-se a chamada "unidade imaginária" i, com a seguinte propriedade: i² = -1. Assim, chamamos de número complexo todo número na forma a + bi, em que a e b são números reais. Observe que se fizermos b = 0, teremos apenas a; ou seja, qualquer número real é também complexo. Dizendo de outra forma, o conjunto dos números reais é um subconjunto do conjunto dos números complexos. Para continuar o estudo, sugerimos o seguinte endereço: http://pessoal.sercomtel.com.br/matematica/medio/ncomplex/ncomplex.htm

Comentário 4: Aqui o autor da resposta simplesmente ignorou a pergunta. Aparentemente ele sequer entendeu o meu questionamento. Na usual notação a+bi para números complexos, tanto a quanto b e i são números complexos. Ou seja, as operações de adição e multiplicação que aparecem na notação acima são definidas entre números complexos. Temos novamente a perpetuação de outro erro comum na literatura tupiniquim. 

Questão 5: Qual é a diferença entre uma função e o gráfico de uma função?

Resposta 5: Dados dois conjuntos A e B, dizemos que uma relação entre elementos de A e B será função (função de A em B) quando todos os elementos de A estiverem relacionados a elementos de B, de tal forma que cada elemento de A esteja associado a um único elemento de B. Ou seja, a função propriamente dita é um tipo de relação entre dois conjuntos. O gráfico é apenas uma representação visual. Por exemplo, considere uma função f, de R em R, que associa a cada x o seu dobro acrescido de 3 unidades. De modo simplificado, escrevemos somente f(x) = 2x + 3. Já a representação gráfica de f será uma reta ascendente, inclinada em relação ao eixo das abscissas. Espero ter ajudado. Conte sempre conosco!

Comentário 5: Nesta resposta o autor não explica o que é uma relação. Portanto, não define função. Além disso, o gráfico de uma função é simplesmente um conjunto. Logo, não pode ser visualizado. Conjuntos não têm forma

Questão 6: Qual é a definição de força? 

Resposta 6: Temos intuitivamente a idéia de que é força toda vez que puxamos ou empurramos um objeto. Podemos afirmar que força é o agente físico capaz de movimentar, parar ou deformar um corpo. Exemplos de Forças: Uma pessoa chutando uma bola; Um caminhão puxando um carro por meio de uma corda; Um pugilista desferindo um soco em seu adversário. Esses são exemplos de força nos quais é necessário contato físico, sendo chamadas de "forças de contato". A força de atração gravitacional entre a Terra e a Lua ou a força de um imã e um pedaço de ferro agem mesmo à distância, sem a necessidade de haver um contato físico entre os corpos, sendo chamadas de "forças de campo". Devemos lembrar que todo o tipo de força deve ser representado através de vetores, pois é uma grandeza que só fica perfeitamente caracterizada quando se conhece seu módulo (ou intensidade), sua direção e seu sentido.

Comentário 6: Exemplos pontuais não caracterizam a definição de um conceito tão amplo quanto o de força. Logo, o autor não definiu força. Obviamente reconheço a considerável dificuldade para definir força em mecânica clássica. No entanto, este é um momento formidável para o professor exercer honestidade intelectual e admitir: eu não sei o que é força. 

Vale observar que todas as seis respostas que recebi foram assinadas em nome do mesmo profissional de ensino e enviadas em um intervalo de dez minutos, poucas horas depois que remeti as questões. 

Em suma, para aqueles que defendem o ensino a distância, posso dizer o seguinte. Se o nível intelectual do ensino a distância em nosso país for o mesmo praticado no cotidiano das escolas brasileiras, é claro que essa nova modalidade de ensino deve ser estimulada! Afinal, ela é bem mais barata. Não há sentido em pagar mais caro pelo mesmo nível de ignorância e preconceito.

Aproveito para avisar que encaminharei o link desta postagem para a Apoio Escolar 24 horas. 

http://adonaisantanna.blogspot.com.br/2013/02/professor-pre-pago.html

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

‘Negociação’ Governo e SINTEPE


Pontos colocados pelo SINTEPE na reunião de negociação com o governo em 14 de fevereiro na SEDUC-PE:
Pauta da Campanha Salarial 2011/2012, condições das escolas da rede/reordenamento, PCC (Plano de Cargos e Carreiras dos Trabalhadores em Educação) reformulação do Estatuto do Magistério, eleições para direção das escolas, concurso público, licenças médicas/atendimento Junta Médica, contratos temporários, outros.
Respondendo a alguns questionamentos o Secretário de Administração/Educação, Ricardo Dantas, assegurou que, o governo não pretende  convocar os aprovados em concurso passado (2008) e acrescentou: ‘Devido a redução do número de alunos, há mais professores que o necessário’. 
Um absurdo. Sabe-se que,  há nas escolas da rede  um  número excessivo de professores contratados temporariamente e, em outras  há falta de  professores nas diversas disciplinas. 
Para a reformulação do PCC,  o secretário disse que tinha  uma idéia, apenas uma idéia  mas, vindo do governo qualquer ‘ideia’ relacionada aos trabalhadores em educação, torna-se preocupante e perigosa.  A ’brilhante ideia’ do secretário é, atrelar a progressão por desempenho ao ‘sucesso  do aluno’. Ou seja, se o aluno não ‘progredir’ o professor  não mudará  de faixa.
Quanto a municipalização, o governo reafirmou a intensificação do processo. Dessa forma, continuará equivocadamente  fechando turmas e transferindo a responsabilidade do Ensino Fundamental para os municípios, contrariando a Constituição Federal quando em seu artigo 211 (da Educação) cita  que, a organização do Ensino Fundamental e Médio deve ocorrer em  regime de colaboração entre estados e municípios.
Para outros  pontos levantados , Ricardo Dantas  comprometeu-se em convocar o sindicato  para uma reunião quando tiver  respostas para os mesmos.
Assim, sem novidades nem expectativas concluiu-se a ‘reunião de negociação’.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

ADEUS REAJUSTE PARA FEVEREIRO

Sintepe cobra que governo apresente proposta para o aumento no Piso SalarialPDFImprimirE-mail
Notícias Destaque
Escrito por Everson Teixeira   
Ter, 19 de Fevereiro de 2013 10:36

Reunião terminou com a promessa de que uma proposta para o reajuste será apresentada até o próximo dia 13.

Representantes do Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Pernambuco (Sintepe) estiveram reunidos, nesta segunda-feira (18), com os secretários estaduais de Administração, Décio Padilha, e de Educação, Ricardo Dantas. O encontro foi resultado de uma primeira reunião realizada no último dia 14 de fevereiro, onde foram apresentadas algumas reivindicações da categoria.

Nesta segunda-feira (18), o encontro foi norteado principalmente pela discussão sobre o reajuste do Piso Salarial dos Professores em Pernambuco. Em janeiro deste ano, o Ministério da Educação divulgou uma portaria onde apresenta o reajuste de 7,97% para o piso em 2013, passando de R$ 1.475,46 R$ 1.566,48.  O objetivo do Sintepe é conseguir um reajuste maior em relação ao que foi apresentado pelo Executivo Federal.

Durante o encontro, os secretários apresentaram dados sobre a arrecadação do Estado em 2012. Segundo eles, houve uma redução na expectativa da arrecadação estadual no ano passado, o que deve refletir na economia local em 2013. Mesmo com o indicativo, o Governo Estadual ficou de apresentar uma proposta até o dia 13 de março. O Sintepe segue na luta para que os professores sejam valorizados como merecem.

Última atualização ( Ter, 19 de Fevereiro de 2013 11:03 )

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Universidades federais finalmente expostas na Scientific American Brasil

Anos atrás fiz várias contribuições para a Scientific American Brasil, com dois artigos, diversas notas de divulgação e jornalismo científico, revisões técnicas para a Série Gênios da Ciência e uma resenha de um livro de Richard Dawkins, entre outras. No final do ano passado, porém, apresentei uma proposta ao editor Ulisses Capozzoli: publicar um artigo sobre as mazelas das universidades federais brasileiras. Pedi a ele que visitasse este blog, para ter uma ideia melhor sobre o que eu tinha em mente. Capozzoli imediatamente concordou, percebendo que certas questões sobre as universidades públicas precisam ser urgentemente discutidas.

A edição de fevereiro de Scientific American Brasil com o artigo em questão já está nas bancas brasileiras e portuguesas. No editorial, Capozzoli dá especial atenção ao artigo, afirmando que "o que ocorre nessas instituições [universidades públicas] é a ação nefasta de grupos/pessoas interessadas na fermentação interna da mediocridade intelectual como estratégia de sobrevivência parasitária".

Com permissão do editor, reproduzo aqui uma versão do artigo original, adaptada ao perfil deste blog. 


Agradeço ao editor Ulisses Capozzoli não apenas pela importante iniciativa, mas principalmente pela cuidadosa revisão que ele fez na primeira versão do texto. 


Parte significativa do artigo contém informações e discussões já veiculadas aqui, principalmente sobre o problema da estabilidade de emprego entre professores de instituições federais de ensino superior. Mas há também tópicos que ainda não exploramos neste blog. 


Veremos, agora, as reações dos diferentes segmentos sociais deste país. As primeiras mensagens de reação já começaram a chegar, principalmente de jovens estudantes.


Desejo a todos uma leitura crítica.

________


Ciência e Educação (de qualidade) são a Base da Esperança


Em 1998 o Governo Federal criou por decreto a Gratificação de Estímulo à Docência no Magistério Superior. Tratava-se de um adicional ao salário dos docentes de instituições federais de ensino superior (ifes), cujo valor dependia da produtividade em ensino, pesquisa, extensão e administração de cada professor. Pouco tempo depois o valor máximo desta gratificação foi incorporado aos salários de todos os docentes concursados das ifes. Os professores que sistematicamente tinham produtividade máxima (de acordo com critérios governamentais) continuaram a receber em seus contra-cheques o mesmo valor de meses anteriores. Os demais, com produtividade inferior, conquistaram significativo aumento em seus vencimentos. 

Este é um exemplo que retrata com fidelidade o quadro típico da universidade pública brasileira: a falta de meritocracia. E, sem reconhecimento efetivo de mérito, como promover progresso científico e tecnológico relevante? Esta falta de políticas meritocráticas na academia brasileira atinge não apenas professores e pesquisadores, mas também alunos e funcionários do quadro técnico-administrativo. 

Neste artigo esboço de forma muito breve alguns dos mais graves problemas crônicos do ensino superior público - com ênfase nas universidades federais - e algumas consequências de tais problemas, geralmente gravitando ao redor da confortável garantia de emprego para todos os professores concursados. O foco deste texto se justifica de forma simples. As universidades federais de nosso país têm um papel estratégico fundamental em toda a rede educacional brasileira. Ações e políticas de instituições privadas e estaduais de ensino superior ou médio são muitas vezes dependentes de práticas comuns às universidades federais espalhadas pelo território nacional, as quais são fortemente controladas pelo Governo.

Instituições federais de ensino superior não têm autonomia para contratação, demissão ou negociação salarial de professores. Concursos públicos, para fins de contratação de novos docentes, somente podem ser realizados através de editais nacionais do Governo Federal. Localmente, não há como negociar a contratação de professores, não importando a competência dos mesmos, fatores emergenciais ou as necessidades da instituição. Sempre devem ser aguardados os editais governamentais. Demissões somente podem ocorrer em casos extremamente graves, como abandono do cargo. Participei, anos atrás, de uma comissão interna da Universidade Federal do Paraná (UFPR) que deveria avaliar a situação de um docente que não aparecia no trabalho há pelo menos seis meses. Esta foi uma demonstração muito clara da lentidão administrativa de uma universidade federal. Se um docente lecionar de forma incompetente ou se não realizar atividades de pesquisa, extensão ou administração, isso não caracteriza motivo suficiente para demissão ou perda de privilégios básicos do cargo. Vale observar que estou falando da prática e não daquilo que consta em documentos oficiais. Também não estou discutindo sobre professores substitutos, os quais são contratados por tempo determinado, ganhando salários muito inferiores aos de concursados.

Se um professor é contratado após realização de concurso público, ele deve cumprir um estágio probatório de três anos. Após este período, seu cargo está praticamente garantido, independentemente de sua produção posterior ao longo de toda a vida acadêmica restante. Além disso, docentes podem eventualmente progredir em planos de carreira, mas jamais regridem. Uma vez que um docente se torna Associado III, por exemplo, jamais pode regredir para Associado II ou I, mesmo que nada mais produza após sua última progressão funcional. 

É claro que há professores de ifes que mantém excelente produção acadêmica. Mas existem também aqueles que faltam às aulas (sem registro oficial de tais faltas), não cumprem ementas de disciplinas ou horários de aulas, não realizam pesquisa alguma ou qualquer atividade de extensão e nem orientam alunos de graduação ou de pós-graduação. Tais professores podem contar com os mesmos benefícios da estabilidade dada aos mais produtivos. 

São várias as consequências do conforto conquistado através da estabilidade irrestrita. Uma delas é o fato de que comumente professores mais antigos se sentem intimidados por jovens que demonstram talento evidentemente superior à média, e muitas vezes usam mecanismos burocráticos absurdos como tentativa desesperada para nivelar todos a um mesmo patamar de desempenho mediano. Cito um caso que eu mesmo testemunhei. Durante minha chefia do Departamento de Matemática da UFPR, de 2005 a 2007, fui relator de um processo de pedido de afastamento de um casal de jovens professores recentemente contratados pelo Departamento de Estatística daquela instituição: Leonardo Soares Bastos e Thaís Cristina de Oliveira Fonseca. Ambos foram convidados para realizar doutoramento em ótimas universidades britânicas, sob a orientação de dois pesquisadores de excelente reputação internacional e com bolsas de estudos pagas pelas respectivas instituições estrangeiras. Apesar do Departamento de Estatística ter aprovado as duas solicitações e de meu parecer ter sido justificadamente favorável, o Setor de Ciências Exatas (instância superior) indeferiu os pedidos. A alegação foi o estágio probatório, o qual deveria ser cumprido por ambos. Legalmente, o estágio probatório poderia ser cumprido no exterior, uma vez que o vínculo empregatício com a UFPR seria mantido. E os membros do Conselho do Setor de Ciências Exatas sabiam disso. Mas o fato é que vi de perto os verdadeiros motivos para negar os pedidos de afastamento temporário: o medo provocado por jovens que crescem rapidamente em suas carreiras. O resultado não poderia ser outro. O ambicioso casal pediu demissão e seguiu rumo para a Inglaterra. Hoje são professores doutores das Universidades Federal Fluminense e Federal do Rio de Janeiro. Ou seja, apesar das políticas das ifes serem praticamente as mesmas em todo o país, este casal ainda insiste em apostar no futuro de nossa nação. Afinal, o Brasil precisa de estatísticos de alto nível. 

A consequência mais óbvia da estabilidade irrestrita para docentes das ifes é a falta de um ambiente competitivo na vida acadêmica pública. É claro que muitos professores com produção científica (nem todos) têm acesso a bolsas de estudo e/ou pesquisa, o que caracteriza um certo reconhecimento de mérito por parte de órgãos de apoio que são geralmente externos às ifes. E a manutenção dessas bolsas depende da contínua produção científica dos beneficiados, de acordo com critérios muitas vezes exigentes. No entanto, seus cargos em suas instituições de origem jamais estão ameaçados, ainda que não produzam conhecimento algum. E mesmo em casos de faltas graves, como a prática comum de lecionar conteúdos de forma superficial e até errada, o cargo continua garantido. As ifes ainda contam com o trabalho competente de diversos pesquisadores e cientistas brasileiros, algo que dificilmente pode ser encontrado em universidades privadas deste país. Mas, em geral, as condições de trabalho deles em pouco difere daquelas ofertadas a todos os demais. Temos, assim, um ambiente de pouco estímulo à produção intelectual relevante do ponto de vista do exigente cenário internacional.

O Brasil não é internacionalmente reconhecido como uma nação que produz ideias. Os Estados Unidos são um país tão novo quanto o nosso. Mas as melhores universidades do planeta estão na América do Norte, de acordo com diversas pesquisas internacionais realizadas de forma independente. Por que o Brasil não consegue se destacar em produção científica? Não estaria na hora de percebermos que estamos fazendo alguma coisa errada? Mentes brilhantes nosso país tem desde muito tempo atrás.

Carlos Chagas foi oficialmente indicado ao Nobel de Medicina em duas ocasiões. Perdeu porque Afrânio Peixoto era contrário à política meritocrática adotada por Chagas durante sua gestão no antigo Departamento de Saúde Pública do Governo Federal. Deste modo, Peixoto e colegas fizeram campanha perante a Comissão Nobel, no Instituto Karolinska (Suécia), afirmando, resumidamente, que o trabalho de Chagas não merecia atenção alguma. 

Natural de Petrópolis, RJ, Peter Medawar ganhou o Nobel de Medicina, mas durante a juventude teve a cidadania cassada pelo Governo Federal, simplesmente porque não se apresentou ao serviço militar obrigatório. Os resultados de suas pesquisas sobre transplantes de tecidos vivos estão acessíveis a qualquer brasileiro, incluindo militares. Mas a cidadania de Medawar somente foi restaurada muito tempo depois e de forma absolutamente discreta. Por sorte Medawar tinha cidadania britânica também. Assim, Inglaterra ganhou um Prêmio Nobel a mais e o Brasil até hoje ignora a fundamental importância da ciência feita em ambientes competitivos. 

Universidades estadunidenses também conferem estabilidade para professores. Mas são poucos os que recebem este benefício, conhecido como tenure. O critério é simplesmente meritocrático. E tal mérito não se avalia através de concurso público realizado em dois ou três dias, mas ao longo de uma extensa carreira marcada por contribuições de elevada relevância acadêmica e negociações. A concessão de estabilidade irrestrita a qualquer professor universitário ou pesquisador é uma forma extremamente eficaz para cultivar um ambiente sem desafios significativos. E ciência, como qualquer outra atividade profissional de alto nível, se fundamenta na constante luta para vencer desafios.

Um docente de instituição federal de ensino superior pode ter acesso a bolsas governamentais de pesquisa e orientar alunos de pós-graduação, se demonstrar produção científica principalmente na forma de artigos publicados em certos veículos especializados de circulação internacional. No entanto, em áreas como matemática, física, química e biologia, esta produção é especialmente avaliada a partir de números que nem sempre têm a ver com qualidade. Avalia-se a quantidade de artigos publicados em periódicos reconhecidos pelos órgãos de apoio à pesquisa, mas raramente se avaliam fatores extremamente importantes, como impacto social de pesquisas e a efetiva participação dos envolvidos. 

A revista britânica Nature, por exemplo, adota a seguinte política editorial: ao final do artigo publicado deve ser especificada a real contribuição de cada um dos autores. No entanto, a maioria dos periódicos especializados não adota esta postura. A inclusão de nomes de colegas em artigos científicos tem sido cada vez mais frequente, mesmo quando estes colegas não participam de forma alguma no projeto em questão. E apenas uma minoria dos professores pesquisadores das ifes consegue publicar contribuições que demonstram algum impacto significativo à ciência. O mecanismo mais imediato para avaliar impacto é citação. Em geral, quanto mais citações um artigo recebe na literatura especializada internacional, mais relevante é o impacto do trabalho citado. Porém, mesmo esta visão quantitativa tem limitações.

Por conta de um único artigo publicado na revista Nature, o curitibano Cesar Lattes revolucionou a física de partículas elementares. E, por conta deste trabalho, ele também foi indicado ao Nobel. Quantos outros pesquisadores deste país podem dizer que passaram por experiência parecida? Em avaliações de produtividade, para fins de progressão funcional nas ifes, este artigo de Cesar Lattes valeria tanto quanto um trabalho obscuro publicado emPhysics Essays, um dos piores periódicos de física em circulação. E valeria a metade de um livro didático publicado, independentemente de sua qualidade.

A verdade é que vivemos em uma nação na qual há um número crescente de doutores que sequer sabem ler inglês, situação essa simplesmente inadmissível nos países desenvolvidos, principalmente nas áreas científicas. E sem conhecimentos básicos de inglês, como produzir ciência?

De forma alguma recomendo que deveríamos copiar o modelo acadêmico norte-americano. Mas certamente poderíamos aprender muito com modelos que demonstram claramente funcionar melhor do que o nosso. Afinal, as universidades estadunidenses, apesar de inúmeros problemas graves, produzem a maioria das mais impactantes contribuições científicas e tecnológicas do mundo. O Brasil simplesmente não compete.

Nos Estados Unidos jovens ingressam em universidades. No Brasil, jovens ingressam em cursos universitários. Esta é uma diferença profunda entre os dois sistemas. Se um aluno de uma instituição federal de ensino superior consegue vencer as absurdas barreiras do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e do vestibular, ele está praticamente preso a um curso escolhido enquanto cursava o ensino médio e, portanto, enquanto estava longe de qualquer ambiente universitário. Se este aluno percebe que o curso escolhido não está de acordo com seu perfil pessoal, ele dificilmente terá chances de conseguir uma transferência. A burocracia é muito complicada e prática para poucos. Provavelmente terá que se submeter ao ENEM e ao vestibular de novo ou simplesmente desistir, como muitos o fazem. Já em uma universidade norte-americana, seja privada ou estadual, o recém ingresso encontra a oportunidade de conhecer todas as diferentes realidades das opções disponíveis para graduação. Ele tem a chance de escolher seu futuro profissional a partir de um ambiente genuinamente universitário. No Brasil, as ifes operam como instituições poliversitárias. E este modelo é copiado por instituições estaduais e privadas do ensino superior brasileiro. Logo, o Brasil não tem ideia do que é uma universidade. 

Um sistema de ensino superior que exige de um adolescente a escolha de seu curso superior antes de ingressar em qualquer universidade é um sistema que negligencia sua juventude. 

Nas ifes também não existe, de forma séria, a tradição das associações de ex-alunos. Isso significa que as ifes, em geral, não avaliam as carreiras de seus egressos. Uma universidade que não está interessada em saber sobre o destino profissional de seus ex-alunos é uma instituição que não está interessada em conhecer seu papel real perante a sociedade. Novamente temos negligência.

Em 2007 todas universidades federais assinaram o polêmico contrato REUNI(Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais) com o Governo. A Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) foi a última a assinar este pacto. Em troca de dinheiro, essas ifes assumiram o compromisso de aumentar gradualmente suas taxas de conclusão de curso para noventa por cento. Do ponto de vista educacional, essa exigência é simplesmente irresponsável. Cursos nas áreas científicas, por exemplo, comumente apresentam índices de reprovação muito superiores a dez por cento, mesmo nas melhores universidades do mundo. Isso significa que tanto o Governo Federal quanto os professores que alegam lutar pelo ensino superior público de qualidade em seus emocionais movimentos de greve, estão negligenciando o futuro da nação de forma realmente perigosa. A preocupação evidente é com quantidade de jovens que se formam em graduações e não com qualidade de ensino.

Em 2012 a consultoria britânica Economist Intelligence Unit publicou um levantamento global de educação que comparou quarenta países, levando em conta notas de testes realizados por alunos e qualidade de professores avaliados entre 2006 e 2010. O Brasil ficou em penúltimo lugar, denunciando um sistema educacional básico que supera apenas o da Indonésia. Este resultado desastroso é uma das múltiplas evidências de que professores formados pelo ensino superior brasileiro não estão demonstrando competência profissional. Diante da promessa do Governo e das universidades federais de que as taxas de conclusão de curso deverão subir indiscriminadamente para noventa por cento, percebe-se que o futuro reserva um desempenho educacional ainda pior para o Brasil, a longo prazo.

Usualmente também não existem programas de honors (ou equivalentes) nas ifes. Esses programas constituem em uma série de procedimentos de avaliação que reconhecem os alunos que se destacam como os melhores em suas respectivas turmas de formatura. Na prática, os programas de honorsoperam como cartas institucionais de recomendação que simplesmente afirmam: "Este indivíduo realizou seu curso com distinção e louvor." É uma forma de ajudar a alavancar as carreiras dos mais brilhantes. Nas ifes, no entanto, novamente faz-se questão de tratar todos de forma igualitária. Temos assim outro exemplo de negligência em um país cujas universidades públicas geralmente consideram elitismo como algo socialmente reprovável. 

Não existem mais cátedras nas ifes. Se um professor de universidade federal falece, pede exoneração do cargo ou se aposenta, ele libera uma vaga. Não importa se este docente orientou dezenas de doutores, publicou centenas de artigos de elevado impacto, exerceu relevantes atividades administrativas ou influenciou de forma construtiva milhares de pessoas ao longo de sua carreira. Simplesmente não existe continuidade de sua obra. Este senso de continuidade deveria ser estabelecido institucionalmente através da cátedra. O célebre astrofísico Stephen Hawking, da Cambridge University, ocupou a mesma cátedra de Sir Isaac Newton, um dos pais da ciência moderna. Trata-se de um compromisso que deve transcender a mortalidade física dos grandes nomes da ciência mundial. Nas ifes, porém, qualquer obra, por mais relevante que seja, deve morrer junto com o seu autor. O grande lógico brasileiro Newton da Costa é professor catedrático da UFPR. Sua cátedra é um cargo vitalício, conquistado décadas atrás. No entanto, apesar deste grande cientista ser responsável pela formação de uma importante escola de lógicos brasileiros reconhecidos internacionalmente, a UFPR não se preocupa em ocupar esta cátedra com algum profissional que continue tal tradição. Isso porque todas as cátedras foram extintas, não apenas na UFPR, mas em todas as ifes. Temos aqui um exemplo de negligência com obras relevantes. Falta a percepção de que memória não se promove apenas com museus ou nomes dados a salas de aula e bibliotecas.

Mantenho um blog no qual promovo discussões e articulo ações sobre educação, com especial ênfase à matemática. Neste sítio convoquei alunos de ifes a espalharem cartazes em suas instituições de ensino com a frase "Professor de universidade pública tem seu emprego garantido, independentemente da qualidade de suas aulas." É uma frase simples, excessivamente resumida, mas que retrata um fato importante. Os jovens que atenderam ao pedido foram surpreendidos com manifestações imediatas de extrema intolerância, vindas justamente de professores. Docentes concursados, que viram esses cartazes, simplesmente os arrancaram. Cartazes colados em paredes foram dilacerados. Há pouco espaço para autocrítica nas ifes. 

Recentemente recebi convite da revista Sem Fronteiras, da Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (SETI) do estado do Paraná, para escrever um artigo. Imediatamente escrevi um texto crítico sobre a educação brasileira. Recebi a resposta de que aquele texto não poderia ser publicado, pois não interessava à SETI criar atritos políticos com demais setores do governo paranaense. Em função desta resposta, escrevi outro artigo, no qual eu criticava o papel do filósofo da ciência nos dias de hoje. O artigo foi publicado na íntegra. Ou seja, criticar filósofos não tem problema. Mas criticar o sistema público de ensino é desaconselhável. E isso ocorreu em uma revista chamada Sem Fronteiras

Quando propus o presente artigo ao editor Ulisses Capozzoli, a resposta foi imediata: se a Scientific American Brasil publica artigos contendo críticas a universidades dos Estados Unidos e de outros países, por que não criticar universidades brasileiras? Esta é uma postura genuinamente científica. Sem crítica, não se faz ciência e nem educação. Sem crítica, não se sustenta uma instituição de ensino séria e competitiva e, em particular, uma universidade. E os exemplos de negligência dados são igualmente exemplos de falta de crítica.

Professores de física falam de infinitésimos em suas aulas de graduação e pós-graduação, quando modelam fenômenos físicos através de ferramentas do cálculo diferencial e integral. No entanto, o cálculo ensinado nas mesmas instituições não emprega infinitésimos, conceito este fundamental em um estudo avançado conhecido como análise não standard. Professores de cursos de letras, quando lecionam linguística, discutem sobre gramáticas gerativas de Chomsky, sem de fato conhecer teorias de conjuntos, o que torna o estudo sério a respeito do tema simplesmente impossível. E docentes de cursos de filosofia abordam filosofia da ciência sem jamais terem tido qualquer contato com atividades científicas, no sentido estrito do termo. Apesar destes problemas não serem exclusivos das universidades federais, certamente a perpetuação de tamanha ignorância em tais instituições constitui um péssimo exemplo que se propaga em praticamente todas as universidades do país. O próprio Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) considera lógica matemática como especialidade da álgebra, em sua classificação de áreas do conhecimento, demonstrando desconhecer o que é lógica matemática.

O conceito de universidade deve apelar fundamentalmente para uma visão de universalidade, como o próprio nome sugere de forma trivial. Muitas das mais importantes contribuições científicas da história exigiram pesquisas interdisciplinares. A descoberta da estrutura molecular do DNA, por exemplo, somente foi possível graças a aplicações de métodos de ciências físicas em biologia. A própria filosofia da ciência, nos dias de hoje, avançou para muito além das ideias de Karl Popper, autor ainda venerado em graduações brasileiras como uma espécie de líder atual que conduz aos temas mais avançados da metodologia e da epistemologia. O casamento entre filosofia da ciência e métodos avançados de lógica matemática praticamente não é discutido nas salas de aulas de nossas universidades. Enquanto nossos professores universitários em geral ignoram as profundas riquezas da psicologia matemática e das aplicações da teoria matemática das decisões em ciências humanas, entre outros exemplos de interdisciplinaridade, o Brasil continua estagnado perante as nações que tradicionalmente produzem conhecimento científico de alto nível e que, por conta disso, crescem dos pontos de vista social e econômico. Não é por acaso que nossas graduações em engenharias são reconhecidas apenas como cursos técnicos em países europeus.

Fala-se muito da necessidade de valorizar o professor no Brasil. No entanto, os professores do ensino público frequentemente querem impor essa valorização através de greves que reivindicam melhores salários para todos, sem qualquer discriminação. Se docentes desejam honestamente ser valorizados, poderiam examinar certos exemplos que ocorrem em outras categorias profissionais. Médicos, psicólogos, engenheiros, arquitetos e até mesmo corretores de imóveis contam com o apoio de códigos de ética. Professores, porém, não têm qualquer código de ética para estabelecer padrões de qualidade de suas profissões e mecanismos de proteção e punição. Códigos de ética certamente não resolvem de maneira definitiva o problema da valorização profissional. Mas constituem um importante passo, de caráter muito mais meritocrático do que greves. Mas, para isso, seria necessário que os docentes dialogassem com especialistas em ética, cujas competências sejam internacionalmente reconhecidas. Sem diálogo entre diferentes áreas do saber, não há universidade e nem educação. 

Para o leitor perceber melhor as origens da incompetência dos professores brasileiros, recomendo a leitura deste artigo de Paula Louzano e colaboradores.

Nos Estados Unidos todas as instituições de ensino superior são pagas, incluindo estaduais e municipais. No Brasil as universidades públicas são gratuitas. Este é um exemplo brasileiro de profunda responsabilidade social. Mas qualquer que seja a realidade educacional e científica de uma nação, sempre haverá problemas graves a serem resolvidos. Portanto, a visão crítica jamais deve deixar de existir. Porém, levando em conta nossa realidade de hoje, fica evidente que ainda não encaramos de frente os problemas mais crônicos e graves.

Há muito tempo o Governo Federal tem investido consideráveis verbas para apoiar pesquisas e expandir vagas em universidades. E graças a iniciativas como a criação de institutos de pesquisa, projetos de convênios internacionais e órgãos de apoio ao desenvolvimento científico e tecnológico, o Brasil conseguiu conquistar um certo reconhecimento internacional em algumas áreas da medicina, matemática e física, para citar umas poucas. 

Mas a preocupação principal que deve ser colocada, atualmente, é sobre a estrutura fundamental do ensino superior brasileiro. E o primeiro foco de atenção deve ser voltado às instituições federais de ensino superior, as quais respondem por grande parte da produção científica da nação e estão ao alcance de ações imediatas do Governo Federal. Em alguns rankingsinternacionais, as primeiras universidades brasileiras citadas são duas estaduais de São Paulo. Eventualmente aparecem também nestas listas a Universidade Federal do Rio de Janeiro. Mas suas colocações são sempre modestas. E na rigorosa classificação Shangai, nenhuma instituição brasileira é citada. 

A situação econômica do Brasil, bem como seus reflexos sobre a qualidade de vida de cada um de nós, não serão sustentados a longo prazo sem uma revisão drástica sobre os fundamentos de nossa educação e produção científica e tecnológica. Sem ciência e educação, simplesmente não há esperança.
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