segunda-feira, 6 de agosto de 2012

PROSTITUIÇÃO NO CONGRESSO NACIONAL

PECADO CAPITAL

Eles têm poder, dinheiro e estão fora das vistas de suas esposas. Do outro lado, garotas de programa dispostas a tudo para atendê-los. Saiba como funciona o esquema de prostituição de luxo nos corredores do Congresso Nacional

Por Rafania Almeida*
Fotos Adriano Machado

CABELOS NEGROS, COMPRIDOS E OLHOS MARCADOS PELA MAQUIAGEM EXAGERADA. A beleza não é de chamar a atenção. Talvez por isso ela use roupas de cores fortes e justas ao corpo, sobretudo na região da paixão nacional. Quase todos ali na Câmara têm alguma história para contar sobre a moça, que há onze anos trabalha na casa coletando assinaturas de deputados em projetos de lei. Há diversas meninas desempenhando essa mesma função nos corredores da Câmara. Mas a bela morena não se limita às assinaturas. Chama muitos parlamentares pelo primeiro nome, deixando transparecer uma certa intimidade entre eles. Distancia-se para conversar com um deles, enquanto espero. Quando volta, é clara e direta: “Você precisa ser simpática. Sorria. O deputado gostou de você.” Sua Excelência, diz ela, mandou dizer que é evangélico e solteiro. “Não seja boba! Ele te traz pra cá, para o gabinete dele.” O deputado evangélico se aproxima. Tem olhos claros e 46 anos de idade, 20 a mais que eu, uma jornalista tentando trazer à luz como o sexo e o poder caminham lado a lado em Brasília. Enquanto a morena de saia apertada mostra-se orgulhosa pelas apresentações, o parlamentar firma o olhar sobre mim, como quem confere um produto.

É quarta-feira, dia de intenso movimento no Congresso Nacional. Mas o vaivém está longe de inibir Suas Excelências de praticar com afinco o corpo a corpo – não com seu eleitorado, claro, mas com garotas de programa. A reportagem passou três semanas na Câmara e no Senado, observando e ouvindo relatos das próprias prostitutas, que abriram suas caixas de pandora e revelaram como trabalham. Muitas são contratadas em cargos comissionados, e aproveitam a proximidade com o poder e o dinheiro para angariar clientes. Outras passam por ali apenas para bater ponto, com empregos de fachada mantidos por parlamentares safadinhos. Mas nem tudo acontece ali, claro. Longe da vista de suas esposas, políticos também fazem hora extra em hotéis, restaurantes e casas noturnas da cidade, para relaxar nos braços de prostitutas de luxo – cada vez mais especializadas na conquista desse tipo de cliente, comportando-se como verdadeiras marias-congressistas. “Se os políticos fizerem greve, as putas de Brasília quebram as pernas”, resume uma das mais requisitadas.

A bela morena, enfim, sente-se à vontade para revelar que um deputado pagou sua faculdade de direito, mas que ela desistiu dos estudos na metade do curso. “Fazer direito para quê? Ficar enfiada em uma salinha? Amo colher assinaturas. Amo os parlamentares”, diz. Orgulha-se de ter comprado um apartamento de R$ 200 mil, valor que não cabe nos R$ 3 mil que diz receber por mês, oficialmente. Um homem observou a movimentação e aproximou-se: “Ela ganha muito mais por fora”, diz. “Já saiu com deputados, mas hoje está mais para agenciadora do que para agenciada. Se quiser, te consigo uma vaga aqui e você vai parar rapidinho em um gabinete”, completa o cafetão infiltrado. Fico sabendo, então, que “um bom desempenho” poderia render-me R$ 10 mil mensais.

Belas e ousadas. Esse é o perfil de algumas das garotas das assinaturas da Câmara. O objetivo é conseguir pelo menos 171 assinaturas para um projeto. Em meio às garotas é possível encontrar poucos homens, e há duas ou três senhoras que já estão lá há anos na função. Poucas meninas não chamam a atenção pela aparência. Nem todas vão além do recolhimento de assinaturas, mas não são poucas as que buscam mais do que isso. Uma delas, de pernas grossas e quadril abundante, se destaca pelo tamanho do vestido. A jaqueta jeans esconde um pouco, mas nada desmerece as curvas da pequena moça em cima de seu salto 15 cm. Alguns disfarçam, enquanto outros quase quebram o pescoço para conferir o corpo dessa e os de outras meninas. Há parlamentares que nem assinam, mas fazem questão de dar uma paradinha para cumprimentá-las. A simpatia é mesmo uma arma de trabalho, às vezes exacerbada.

Conversas de banheiro
As moças não trabalham todos os dias, apenas quando têm sessão, de terça a quinta-feira. É no banheiro do corredor das lideranças que abrem o bico sobre suas aventuras políticas. “Aquele velho me levou para a tal festinha, como é pegajoso!”, revela uma delas, aos risos. Outra dá dicas para aguentar, pois os “presentes valem a pena”. Contam detalhes sórdidos sobre as atitudes de Suas Excelências, mas sem deixar escapar demais e se queimar no meio. Outra admite: “Eu adoro as festinhas. Vou a todas.” O colega homem, em desvantagem na corrida pelas assinaturas, aproveita a ausência das meninas para revelar segredos: “Aquela ali não era ninguém aqui. Andava de jeans e camiseta. Hoje posa em cima do salto e vestidinho brilhante, contratada pelo gabinete de um deputado.” Diz que já viu meninas, que ganhavam R$ 3 mil sem nenhum contrato com a Casa, receber bônus de até R$ 15 mil. “Deputado não mede esforços para conseguir o que quer, se é que você me entende”, conta o rapaz. “Você não tem vontade de colher assinaturas também? Tem gente aqui que ia gostar de você”, pergunta, no intuito de também ganhar um por fora.

As duas moças têm beleza e grande poder de sedução. Fazem sucesso no Congresso. A mais famosa é uma loira que já ganhou de jantares românticos nos restaurantes mais caros da cidade a propostas de programa com direito a voo de jatinho. Contratada pela Câmara, desfila pelos corredores com forte ênfase nos movimentos corporais. Os apaixonados, mas sem cacife para passar uma noite com a moça, dizem que ela já foi mais humilde. “Cobrava R$ 700, mas, depois de desfilar com o mais cotado dos parlamentares e o maior fã de garotas de programa, já pede R$ 1,2 mil por uma noite”, conta um funcionário. Apesar de trabalhar para outras pessoas, escolheu seu preferido e costuma passear com ele pelos corredores da Câmara. “Ela é tão encantadora que tem homem sofrendo de amor, pagando presentes caríssimos para conquistá-la, incluindo joias, roupas e jantares. Mas ela não quer saber de presente, quer dinheiro mesmo”, revolta-se um admirador. O deputado que valoriza o passe da jovem já está no segundo ano de desfile com a mais cobiçada do Congresso. Mas dele ela não cobra. Um admirador não correspondido explica a lógica: “Esse deputado aí é um especialista em putas. Se ele está comendo ela, é porque a moça vale realmente a pena. E aí, todos a querem. Já a moça, ciente disso, pode aumentar seu passe”, diz o assessor. “Já ouvi dizer que ela chegou a cobrar R$ 5 mil por uma única noite.” E como possui o selo de qualidade do parlamentar especialista, não faltou quem pagasse o alto valor.

A amiga da loira famosa também não mediu esforços para fazer contatos no Congresso, o que lhe rendeu uma carteira de clientes de respeito e com contas bancárias recheadas. A espertinha conseguiu crachá falso que lhe dava acesso ao plenário, onde podia ficar mais próxima de seu público-alvo. Certa vez, armou uma confusão e foi barrada pelos seguranças, que descobriram a falcatrua do crachá – mas nem isso foi o suficiente para atrapalhar seus planos. Já havia tido tempo suficiente para fazer “amizade” com parlamentares e garantir um lugar ao lado deles no elevador de autoridades, onde não importa o crachá, mas o poder do deputado ou do senador. Segurança algum ousa levantar a voz para ela. Tanto fez e aconteceu, que acabou conseguindo uma vaga no Senado. Trabalhava no cerimonial, mas foi demitida pelos sucessivos barracos que aprontava. Foi indicada para trabalhar na Procuradoria-Geral da República, onde passava apenas para deixar a bolsa e voltar ao Congresso para dar duro. Bastaram os três meses de experiência para ser demitida e voltar ao Senado, no emprego em que está até hoje. E ainda aproveita para fazer propaganda do negócio que mantém fora, com serviços que custam R$ 1,2 mil por noite.

Enquanto algumas conseguem angariar clientes poderosos dentro do próprio Congresso, outras meninas têm de se virar com os trabalhos “externos”, em hotéis e casas noturnas “especializadas” no assunto, como o Pathernon e a boate do hotel Bonaparte. Os dois lugares abrigam as jovens mais bonitas e mais caras da cidade, mas em compensação oferecem os ambientes mais discretos. Seguranças, motoristas e assessores figuram como amigos, para que ninguém desconfie de nada, enquanto elas comem e bebem do bom e do melhor, por conta de Suas Excelências. “Sempre me alimento melhor quando o cliente é político. Eles querem mostrar que podem e nisso não economizam.” Miriam é encantada por eles. Na cama da menina de 18 anos, eles se transformam em pessoas carinhosas, preocupadas, atenciosas: “Está com frio? Eu cuido de você.” Ela não se esquece do prefeito mineiro que atendeu durante uma das marchas dos prefeitos. “Ele continua me ligando, mesmo não estando aqui.”

Diz que o dinheiro dos políticos garantirá a ela, em breve, um apartamento no Sudoeste, região emergente da capital, e de alto poder aquisitivo. Por ora, preocupa-se apenas em manter-se bonita e pagar o aluguel de R$ 2 mil em um flat. Em julho, nas férias, aceita fazer programa com pessoas de menor poder aquisitivo. Cobra R$ 400 a hora, dependendo do tipo de trabalho. “É apenas para manter o meu padrão de vida, mas eu gosto mesmo é quando o Congresso está funcionando. Ganho muito mais.” Foi com um deputado nordestino que teve uma de suas noites mais inusitadas. Achou que a calcinha vermelha rendada que ele tirou do bolso do paletó era presente para ela. Ainda agradecia quando o deputado deixou-a boquiaberta: “Ele se despiu e vestiu a lingerie. E ainda desfilava pelo quarto como uma lady. Andava na ponta dos pés, sorria, parecia uma miss”, conta a moça. Logo depois, viria a descobrir que seu papel naquela madrugada não seria o da menina inocente e sedutora, mas o do homem da relação. Depois disso, nunca mais o viu.

Elas circulam livremente pelo congresso e chamam os deputados pelo primeiro nome, revelando um alto grau de intimidade

Outro ponto rico em clientes são os restaurantes, sobretudo à noite, depois de terminadas as sessões. Viviane, uma loira de seios naturalmente fartos, já foi abordada assim. Conta que bebia um uísque Jack Daniel’s com uma amiga, em um famoso restaurante na Asa Sul, quando dois parlamentares vieram até sua mesa. Elas toparam o programa e seguiram para o apartamento funcional de um deles, mas ficaram indignadas quando, no término “dos trabalhos”, os senhores tentaram pagar menos do que o combinado. “Eles deviam era pagar melhor. Roubam dinheiro do povo, incluindo o meu, eu não perderia a oportunidade de tirar um bom dinheiro deles”, diz Viviane. A loira prefere sair com altos funcionários do governo. Foi com eles que conheceu uma mansão no Lago Sul, com piso de mármore Carrara e um quarto com uma gaveta de mais de um metro de comprimento, de onde um dos clientes tirava notas e mais notas de R$ 100 para impressioná-la. O grande trunfo da jovem de 24 anos, que chega a ganhar R$ 30 mil por mês, é um lobista famoso, do setor de infraestrutura. “Ele tira bolos de dinheiro do bolso para pagar tudo”, conta.

Projeto de lei
Se por debaixo dos panos deputados e senadores se divertem nos braços de garotas de programa, nos discursos oficiais poucos estão dispostos a defender o reconhecimento da profissão mais antiga do mundo. Um projeto de lei do então deputado Fernando Gabeira (PV), de 2003, acabou sendo engavetado por falta de apoio. No mês passado, o assunto voltou à tona, dessa vez pelas mãos do deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ), que tenta articular a criação de um novo projeto de lei sobre o tema. “A sociedade que desaprova a prostituição é a mesma que se serve dela”, disse o deputado, na apresentação da proposta. Além de serem contrários à ideia da legalização das garotas de programa, alguns parlamentares querem acabar com a atividade. Um projeto de lei apresentado pelo deputado João Campos (PSDB-GO) sugere a criminalização do pagamento por serviços sexuais. Mas, para a maioria, melhor mesmo é deixar tudo como está. Pudera: Suas Excelências adoram fazer hora extra.

2 comentários:

  1. #‎ÍNDIOFOBIA‬ DA SOCIEDADE - A Petição: Secretaria Nacional dos Povos Indígenas. Justiça Violações de Direitos Humanos da ONU. Pátria cria Párias “os intocáveis” a 515 anos de enganação, Jurídica do Brasil!
    Petição é GRÁTIS. http://lnkd.in/bwvqDi8

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  2. #‎ÍNDIOFOBIA‬ DA SOCIEDADE - A Petição: Secretaria Nacional dos Povos Indígenas. Justiça Violações de Direitos Humanos da ONU. Pátria cria Párias “os intocáveis” a 515 anos de enganação, Jurídica do Brasil!
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