Professor que teria sido exposto à discriminação faz mobilização contra intolerância
Silvia Bessa - Texto original do Diário de Pernambuco - clique aqui e confira
O pernambucano Antônio Rufino é o cara. Negro, estudioso (com mestrado e cursando doutorado), o professor de português e inglês da Escola Estadual Manoel de Bastos Tigre, em Arthur Lundgren I na cidade de Paulista, tem a melhor compreensão do 13 de maio, lembrado no dia de ontem. Com o olhar muito além do marco cívico e da sanção da lei que extinguiu a escravidão no Brasil, as atitudes de Rufino fazem lembrar que o 13 de maio representa luta. Após entrar em "depressão" por ter sido vítima de "discriminação étnica" e de "intolerância", durante a festa do Dia das Mães onde leciona, Rufino fez a sua parte como cidadão. Desde o último domingo, iniciou a busca por uma "reparação moral" pela "violência" a que diz ter sido exposto. Por e-mail, mobilizou colegas de profissão e instituições ligadas ao movimento afro pedindo apoio para evitar que o "preconceito cultural" persista ou se propague entre pais e alunos. "Não posso deixar que essa discriminação com o negro continue",disse Rufino ao Diario.
O professor Antônio Rufino sensibilizou e acaba de envolver a Comissão de Direitos Humanos, Cidadania e Diversidade da Gerência Regional de Educação da Região Metropolitana Norte (Gre Metro Norte), uma instância da Secretaria de Educação de Pernambuco que media conflitos em 117 instituições em sete municípios do estado. O coordenador da comissão, Nicodemos Felipe de Souza, requereu à diretoria da escola um relatório sobre o ocorrido na festa do Dia das Mães e sobre a diretriz pedagógica e ações de combate à intolerância na unidade. De qualquer forma, já adiantou: deve intervir no caso, promovendo encontros com professores, pais e alunos para amenizar comportamentos racistas e autoritários no convívio social. "Estudaremos o caso, mas com certeza situações como essa têm o preconceito como pano de fundo. A discriminação racial aparece de forma invisível", explica, ressaltando que a função do grupo não é de policiamento; visa orientação de valores.
Eis o episódio que gerou a celeuma: o professor Antônio Rufino sugeriu um projeto para apresentações de danças envolvendo estudantes das turmas de 5ª, 6ª e 7ª séries do ensino fundamental. Para os da 7ª série, trabalhou o livro O corpo fala, teoria do educador e psicólogo francês Pierre Wiel. Coube a esses garotos um número de dança, com a releitura de uma música do grupo Cordel de Fogo Encantado. Três jovens (só um da escola) usaram figurinos africanos e dançaram coreografias com a mesma temática. Rufino - mestre em identidade cultural e doutorando nas questões de memória e resistência - apoiou a atividade, vestindo-se com uma caftan (espécie de bata colorida e típica). Um grupo de mães não gostou. Em reclamação à diretora, Roselina Cândida, elas condenaram a atitude do professor, acusando-o de fazer apologia à "macumba". A palavra "macumba" teria sido citada, segundo o professor, de forma pejorativa, como uma alusão a "coisas do diabo". Foi o assunto da semana na escola.
O episódio é pequeno para quem não vê o conjunto das críticas e o simbolismo da luta do professor Antônio Rufino e de uma cultura negra pouco respeitada, mesmo 122 anos depois do fim da escravatura. Na visão de especialistas, aceitá- las ou incentivá-las pode representar racismo institucional ou falta de conhecimento de leis brasileiras e da democracia no que toca questões étnicas. Poucos gestores sabem ou aplicam, mas desde 2003, a lei federal nº 10.639 obriga a inclusão da história e cultura afro-brasileiras como parte do currículo oficial das escolas do país. Antônio Rufino tentou colocar a lei em prática. Deveria ser copiado.
Enfrentei problemas quando trabalhei Cutura-Afro em turmas de E.J.A, ouvi de alunos que a disciplina "era coisa pra nego. Há certa rejeição princilpalmente quando se discute religião, num Brasil onde negros são maioria...é o fim. O pior é que tem companheiros com pensamento parecido, certa vez um deles perguntou-me em tom de deboche, porque era que eu falava tanto em negro e em favelas...Pode?
ResponderExcluirO centro Luiz Freire chamou essa reportagem de : jornalismo cidadão. Essa frase resume a importância de matérias como esta. Eu também sofri preconceito quando iniciei meu trabalho com a Lei 10639 na Escola Bernardo Vieira, em Jaboatão. Resisti, suei, e não deixei que o racismo me destruisse. O resultado da luta foi ter conseguido plantar a semente da igualdade naquela escola e termos hoje um trabalho que continua com outros e outras professoras que ficaram lá, hoje o Bernardo Vieira vive o enfrentamento ao racismo e já comemora o 20 de novembro. Dessa luta também pude obter uma produção de poesias afro feitas por alunos meus quando eu ainda estava na escola. É o resultado da não desitência da luta, da fé, e do compromisso com os direitos humanos, principalmente na educação, lócus primordial para a construção de uma sociedade mais justa, menos discriminatória. O caso do Prof. Rufino veio à tona também graças ao engajamento de negras e negros na luta para o fim do preconceito, sem presunção, posso dizer que faço parte dessa história. Pois só abracei a causa da luta dos povos negros quando percebi que eu também era uma vítima de racismos e preconceitos de orientação sexual, a dor em mim me fez um homem mais humano e engajado nessa luta. Espero que o exemplo também faça com que o Prof. Rufino que é um homem negro, começe a engajar-se nessa luta dando a contribuição dele como um dos negros da nossa sociedade que possui mestrado e é doutorando (coisa muito difícil em nossa sociedade)para o fortalecimento da luta. Fica aqui, Rufino, o apelo.
ResponderExcluirCarlos Tomaz
MNU-PE, REDE NACIONAL DE NEGRAS E NEGROS LGBT.
Ano passado, a Escola Pastor Amaro de Sena, em Caetés II, escolheu como tema para a Feira de Conhecimentos "Brasil e África - raízes afro-culturais". Como eu era professor de História da Cultura Pernambucana, sugeri que a 8ª série fizesse um trabalho com a seguinte temática: "ÓRIXAS - As divindades afro-brasileiras". Foi o suficiente para se criar uma polêmica na escola, ao ponto de alguns pais proibirem, literalmente, seus filhos de fazerem a pesquisa. Após muita discussão, reflexão, e sobretudo persistência, consegui "convencer" a turma a fazer o tal trabalho. Pegamos uma salinha e fizemos a reprodução de um mini terreiro e cada grupo ficou de explicar um órixa. Foi um sucesso. Tivemos o prazer de fazer, sem falsa modéstia, um dos melhores trabalhos da feira. E mais, a maioria dos alunos que apresentaram era evangélicos da Assembléia de Deus, mas que consegui quebrar a barreira do preconceito e da intolerância entre eles. Existe muito preconceito e discriminação nas nossas escolas, e não é só por questões raciais não. Existe o preconceito contra os deficientes, contra os gordos, contra os feios, contra os ateus, enfim, contra quem não se enquada no padrão que a sociedade impõe através dos meios de comunicação de massa.
ResponderExcluirTambém sou professor da Escola Pastor Amaro de Sena, em Abreu e Lima e assim como o professor José Ricardo, também sou professor de História desta unidade de ensino. Quero dizer de antemão que sou membro da Igreja Assembleia de Deus e tenho minhas próprias opiniões sobre a cultura afro-brasileira. Acredito que o problema nesse fórum está sendo colocado de uma forma tendenciosa. Se o aluno não simpatiza com uma corrente política, religiosa, filosófica ou de qualquer outra natureza, isso é problema dele. O que a escola precisa fazer é não reforçar estereótipos, muito menos criar uma suposta "cultura de tolerância" que só existe na cabeça de alguns professores esquerdistas da rede estadual. Estranho, porque quando os evangélicos são comentados nas escolas, são quase sempre em tom de deboche, ironia, piadinhas ou estúpidos que servem seus pastores, dando dinheiro de graça para eles. E nenhum professor protesta contra isso.
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ResponderExcluirLuciano, francamente defendo que deve ser pregada a concórdia e tolerância para que haja respeito e convivência no meio de uma sociedade marcada pela diversidade!
ResponderExcluirEu sou ateu, mas não abordo minha descrença metafísica como referência para os alunos, pois não faço proselitismo de meu ponto de vista. Prefiro ampliar horizontes para os alunos ao oferecer uma percepção sem preconceitos. Defendo o respeito a todas as crenças e tradições étnica, pois elas são legítimas de maneira igualitária. E conhecer as diferentes manifestações de crenças e culturas é um meio para disseminar não apenas o saber, mas também a convivência.
Você, que critica o que chama de "cultura da tolerância" praticada por "esquerdistas", defende a intolerância amparada em que tipo de princípio? Já não existe intolerância e preconceitos demais por aí?
Professor, se você, como evangélico, sente-se discriminado então faça como o colega, PROTESTE, DENUNCIE!!!
ResponderExcluirEstimado Paulo, agradeço suas contribuições à minha argumentação.
ResponderExcluirComo eu disse anteriormente, sou evangélico e professo livremente a minha fé. De forma alguma procuro fazer proselitismo, mas não fujo a qualquer debate quando sou questionado sobre aquilo que acredito. Também defendo a ideia de que é importante ao professor apresentar diferentes visões aos alunos e levá-los a questionar a realidade que estão inseridos.
Mas, me parece que você confundiu convivência com aceitação. Eu não sou obrigado a acreditar nos princípios defendidos por outras pessoas, mas devo necessariamente ser consciente de que elas tem todo o direito de defender suas crenças e expressões. Se reconhecemos que vivemos em um Estado de direito, as pessoas não são obrigadas a aceitar o que o outro defende, mas reconhecer que o seus pensamentos não são os únicos. Numa sociedade verdadeiramente democrática, as pessoas são convencidas por argumentos e não pela força.
Agora, você questionou o que eu disse sobre "cultura de tolerância", mas ao mesmo tempo afirmou que eu defendo "a intolerância amparada em que tipo de princípío". Francamente, eu não sei onde defendi a intolerância. O que procurei questionar foi o modo como as discussões sobe religião, política, sexualidade e tantas outras coisas são apresentadas na sociedade, levando-se sempre para a imposição de um pensamento. No caso que citei, as discussões relacionadas a esses assuntos, desconsideram o que pensam os evangélicos e suas convicções. Ou seja, prega-se o respeito para um grupo, mas desconsidera-se o que o outro acredita. E essa visão, lamentavelmente vem sendo divulgada pelos esquerdistas. É isso que eu denominei de "cultura da tolerância". Ela só existe para defender o que um grupo da sociedade deseja, mas não reconhece que o outro tem o direito de discordar daquilo que você pratica, vivencia ou acredita.
Mais uma vez, agradeço as suas observações.