terça-feira, 7 de agosto de 2007

CALENDÁRIO DA EDUCAÇÃO : REPOSIÇÃO OU CASTIGO PELA GREVE ?

Por José Ricardo de Souza
Historiador, professor da rede pública estadual, escritor; membro da Academia de Letras e Artes da Cidade do Paulista



A portaria 4994-SE de 3 de agosto de 2007 que trata do calendário de reposição das aulas após o período de greve do professorado da rede estadual vem sendo alvo de constantes críticas pelos professores, pois sua elaboração não condiz com a realidade em que se encontra o ensino público na rede estadual. Segundo esta portaria, a partir do dia 7 de agosto, haverá uma aula a mais nos três turnos, que passarão a funcionar nos seguintes horários: 7:10 h. às 12:30 h. (manhã), 12:50 h. às 18:00 h. (tarde), e 18:10 às 22:10 (noite). Ainda segundo esta portaria, haverá aulas em 7 sábados a serem escolhidos pelas respectivas escolas. O secretário de Educação acredita que com este calendário é possível repôr os 28 dias letivos dispostos durante a paralização que ao todo durou 54 dias.

A problemática surge a partir da análise do contexto da escola pública, de sua clientela e principalmente do seu quadro docente. É de cunho público que o Estado paga aos seus professores um dos salários mais baixos do país, o que obriga os docentes a exercerem uma dupla e às vezes até tripla jornada de trabalho em duas ou mais unidades de ensino, realidade esta que não mudará após os 5% de aumento concedidos após a greve, visto os números que seguem: um professor com nível superior e carga horária de 150 horas (30 horas semanais) passará de R$ 346,74 para 364,08, na prática com os acréscimos e descontos uma diferança de apenas R$ 25,72; para os professores com nível superior e carga horária de 200 horas (40 horas semanais) o salário-base passará de R$ 462 para R$ 485,47, o que representa uma diferença real de apenas R$ 34,71, após os acréscimos e descontos. Qualquer emprego público com nivel médio paga em início de carreira mais de R$ 800,00, menos é claro na área de educação, cuja remuneração sempre foi indigna e vergonhosa para quem se dedica a educar o futuro do país.

Nem preciso citar que quanto menos ganham, menos os docentes podem investir em sua formação acadêmica, muito menos profissional, nem comprar livros e revistas, ou se atualizar, como deveria ser num país onde milhões se gastam com editoras e empreiteiras, mas na hora de se pagar melhor o profissional, nunca se têm verba suficiente; independende do governo ser de direita ou de esquerda, a desculpa (fajuta) é sempre a mesma. A saída é trabalhar em várias escolas, em vários turnos, com turmas superlotadas, sem um mínino de condições técnicas ou pedagógicas para um bom aproveitamento do ensino, fora o aspecto humano, que inclui cansaço, altos índices de stress, rouquidão, e outras mazelas decorrentes da profissão.

A própria Consolidação das Leis Trabalhistas, em seu artigo em seu artigo 71 cita que "em qualquer trabalho contínuo, cuja duração exceda de 6 (seis) horas, é obrigatória a concessão de um intervalo para repouso ou alimentação, o qual será, no mínimo, de 1 (uma) hora", ora como os educadores poderão almoçar e descansar em apenas 20 minutos? É claro que como somos estatutários, a legislação que nos rege é outra: o Estatuto do Magistério; mas ainda assim, fica a questão: esta jornada imposta aos educadores não é uma coisa degradante e porque não dizer desumana, uma vez que os obriga a trabalhar além de seus limites e esforços físicos ?

O novo horário é impiedoso com o turno noturno, o que demostra que quem o elaborou não conhece a realidade das nossas escolas, muito menos dos seus alunos. Quem estuda à noite, predominatemente, trabalha durante o dia, e dificilmente conseguirá chegar no ínicio das aulas previsto para às 18:10 h.. Outra questão que se põe é a segurança de alunos, professores e funcionários para se deslocarem para suas casas após o término das aulas. Com a violência crescente fica bastante perigoso e arriscado estender o período noturno para além das 22:00 h. como impõe o dito calendário, o que poderá expor as pessoas a riscos desnecessários, como assaltos e estupros, comuns nas cercanias de nossas escolas quase sempre cheias de mato e com precária iluminação.

Além destas contradições já colocadas, temos que lembrar que nas escolas estaduais funcionam vários projetos aos sábados, como por exemplo, o Escola Aberta e agora mais recentemente o PE no Futuro, o que deixa uma pergunta no ar: os alunos e professores engajados nestes projetos irão repôr estas aulas em qual horário (restou a madrugada...)?

A meu ver, isto não é um calendário de reposição, mas sim uma retaliação contra os professores que corajosamente desafiaram o governo e o sindicato após 54 dias de paralização, e que só retornaram ao trabalho após medidas autoritárias como o corte de ponto e a ameça de demissão em caso de continuidade da greve. Citar, como tenho lido, que os professores "aceitaram" a proposta do governo é um profundo equívoco, pois os docentes nunca "aceitariam" receber menos do que um salário-mínimo. Eles voltaram, mas por medo, por pressão, porque não dizer, por opressão daqueles que prometeram melhorar a condição dos professores, e que agora no poder, estão perseguindo e penalizando uma categoria tão sofrida quanto a nossa, o que é lamentável e digno de repúdio pela sociedade em geral. É preciso repor as aulas, mas sem ferir a dignidade dos educadores, nem prejudicar os educandos, estes sim as vítimas primárias deste caos em que se encontra o ensino público no nosso Estado.

3 comentários:

  1. Pois é como me sinto,uma condenada a uma pena desumana e degradante.Essa 6 aula é no minimo humilhante fazer o professor ser proibido de se alimentar e decansar. "É pau pra comer sabão e pau pra saber que sabão não se come".

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  2. Eu não assinei termo de compromisso algum e não vou repor aula nenhuma dessa maneira que foi imposta, na verdade essa maneira que foi imposta para reposição das aulas não repõe nada, principalmente no turno da noite, e é só uma forma do secretário energúmeno dizer que está fazendo alguma coisa.

    Só reporia essas aulas se os dias letivos fossem transportados para 2008 e com horário normal de segunda a sexta como tem que ser.
    Qualquer coisa diferente disso é mais uma grande piada em um sistema de ensino que já não funciona.

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  3. As duras penas a que são expostas o Professor, infelismente, demosntram o nível de comprometimento dos dirigentes da Educação do Estado. Prova disso é esse calendário desumano imposto para o professor, maquiado de boas intenções, porém, com a única finalidade que é de punir os mesmo pelo emparedamento legítimo acontecido no ano em curso. è um absurdo o que vivemos...é muito humilhante perceber que o principal instrumento de preparação de melhores dias é tratado com descaso.
    Isso já era previsto... o que esse Danilo Cabral entende de Educação...

    É muito triste...e, infelismente, não podemos esperar coisas melhores...


    Carlos Antonio - ST/PE

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