quarta-feira, 29 de julho de 2009

PROFESSOR - UMA ESPÉCIE EM EXTINÇÃO

Por Verônica Dutenkefer
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Esse texto que escrevo precisamente agora é mais um desabafo.
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Desabafo de uma profissional que está lecionando há mais de 22 anos e que não sabe se sobreviverá por mais dez anos, que é o tempo que ainda precisarei trabalhar (por mais que ame muito o que faço).
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Trago comigo muitas perguntas que não querem calar. E talvez a mais inquietante é: O que será necessário acontecer para se fazer uma reforma educacional neste país?
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Constantemente ouço ou leio reportagens com as autoridades educacionais proclamarem a má formação de seus professores. Culpando as universidades, a falta de cursos de formação e culpando-nos evidentemente.
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Se a educação neste país não vai bem só existe um culpado: o professor.
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E aí vem meus questionamentos:
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Como um professor de escola pública pode fazer o seu trabalho se ele precisa ficar constantemente parando sua aula para separar a briga entre os alunos, socorrer seu aluno que foi ferido por outro aluno, planejar várias aulas para se trabalhar os bons hábitos na tentativa vã de se formar cidadãos mais conscientes e de melhor caráter?
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Nos cursos de formação nos é passado constantemente a recusa de um programa tradicional e conteudista, mas nossas avaliações de desempenho das escolas, nossos vestibulares e concursos públicos ainda são tradicionais e nos cobra o conteúdo de cada disciplina.
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Como pode num país....num estado...num município haver regras tão diferentes entre a rede particular e pública?
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Na rede particular as escolas continuam conteudistas, há a seriação com reprovação, a escola pode suspender ou até mesmo expulsar um aluno que não esteja respeitando as regras daquela instituição.
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A rede pública vive mudando o enfoque pedagógico (de acordo com o partido que ganhou as eleições), é cobrado cada vez menos do aluno, não se pode fazer absolutamente nada com um aluno indisciplinado que até mesmo coloca em risco a segurança de outros alunos e funcionários daquela instituição.
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Dia a dia...minuto a minuto... os professores são alvos de agressões verbais e até mesmo física pelos alunos. A cada dia somos submetidos a níveis de stress insuportáveis para um ser humano.
Temos que dar conta do conteúdo a ser ensinado + sermos responsáveis pela segurança física de nossos alunos + sermos médicos + enfermeiros + psicólogos + assistentes sociais + dentistas + psiquiatras + mãe + pai ......
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E quando ameaçados de morte e recorremos a uma delegacia pra fazer um boletim de ocorrência ouvimos: "Isto não vai adiantar nada!"
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Meus bons alunos presenciam o mal aluno fazendo tudo o que não pode ser feito e não acontecendo nada com ele. É o exemplo da impunidade desde a infância.
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Meus bons alunos presenciam que o aluno que não fez absolutamente nada durante o ano, passou de ano como ele, que se esforçou e foi responsável.
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Houve um ano que eu tinha um aluno que era muito bom. E ele começou a faltar muito e ir mal na escola. Os colegas diziam que ele ficava empinando pipa ao invés de ir pra escola. Um dia, tive uma conversa com ele, e perguntei o que estava acontecendo? E ele me disse: "Prá que eu vou vir prá escola se eu vou passar de ano mesmo assim?"
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Então eu procurei aconselhar (como faço com meus alunos até hoje) que ele devia freqüentar a escola, não para tirar notas boas nas provas ou passar de ano. Ele deveria vir a escola para aumentar seu conhecimento que é o único bem que ninguém poderá roubar.Que a escola iria ajudá-lo a aprender e trocar conhecimentos com os outros e ajudá-lo a dar uma melhor formação na vida.
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Depois dessa conversa ele não faltou mais tanto...mas nunca mais voltou a ser o excelente aluno que era.
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Qual a motivação de ser bom aluno hoje em dia?
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Seus ídolos são jogadores de futebol que não falam o português corretamente e que não hesitam em agredir seus colegas jogadores e até mesmo os árbitros. Ensinando que não é necessário haver respeito as autoridades e aos outros.
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Ou são dançarinas que mostram seu corpo rebolando na televisão e pousando nuas para ganhar dinheiro.
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Para quê eu me matar de estudar se há tantas profissões que não são valorizadas e nem respeitadas?
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Conheci (e ainda conheço e convivo) ao longo de minha carreira na escola pública, inúmeros profissionais maravilhosos. Pessoas que amam a sua profissão, que se preocupam com seus alunos, que fazem trabalhos excepcionais. Que possuem um conhecimento e formação excelentes, mas que estão desgastados e quase arrasados diante da atual situação educacional. Li a poucos dias num artigo que os cursos de filosofia, matemática, química, biologia e outros todos ligados a área de magistério não estão tendo procura nas universidades.
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Lógico!Quem é que quer ser professor?
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Quem é que quer entrar numa carreira que está sendo extinta, não só pela total desvalorização e desrespeito, mas também pela falta de segurança que estamos enfrentando nas escolas.
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Fiquei indignada com uma reportagem na TV (que aliás adora fazer reportagens sensacionalistas colocando o professor sempre como vilão da história) em que relatava que numa escola um aluno ameaçava os outros com um revólver e num determinado momento o repórter perguntou:"Onde estava o professor que não viu isso??!!"
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E agora eu pergunto: "O que se espera de um professor (ou de qualquer ser humano), que se faça com uma arma apontada pra você ou pra outro ser humano??? Ah...já sei...o professor deveria enfrentar as balas do revólver!!!! Claro!!! As universidades e os cursos de aperfeiçoamento de professores não estão nos ensinando isso.
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Vocês tem conhecimento de como os professores de nosso país estão adoecendo????
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Vocês sabem o que é enfrentar o stress que a violência moral e física tem nos submetido dia a dia?
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Você sabe o que é ouvir de um pai frases assim:
"Meu filho mentiu, mas ele é apenas uma criança!"
"Eu não sei mais o que fazer com o meu filho!"
"Você está passando muita lição para meu filho, e ele é apenas uma criança!"
"Ele agrediu o coleguinha, mas não foi ele quem começou."
"Meu filho destruiu a escola, mas não fez isso sozinho!"
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Classes super lotadas, falta de material pedagógico, espaço físico destruído, violência, desperdício de merenda, desperdício de material escolar que eles recebem e, muitas vezes, não valorizam (afinal eles não precisam fazer absolutamente nada para merecê-los), brigas por causa do "Leve-leite" (o aluno não pode faltar muito, não por que isso prejudica sua aprendizagem, mas porque senão ele não leva o leite.)
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Regras educacionais dissonantes de acordo com a classe social dos alunos.
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Impunidade.
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Mas a educação não vai bem, por causa do professor.
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Encerro esse desabafo com essa pergunta que li a poucos dias: Essa pergunta foi a vencedora em um congresso sobre vida sustentável."Todo mundo pensando em deixar um planeta melhor para nossos filhos... Quando é que pensarão em deixar filhos melhores para o nosso planeta?"

2 comentários:

  1. VELHO PROFESSOR, PROFESSOR VELHO


    Claudeci Ferreira de Andrade


    Quanto aprendemos sobre a amizade de nossos alunos e seus relacionamentos interesseiros! Já dizia um colega professor de muitos anos:

    – Aluno quer nota!

    Uma vez, tentando retribuir a prestatividade de uma aluna que tanto me auxiliava em sala e parecia tanto ser minha amiga com suas confidências. Então me dispus a fazer seu currículo, que a muito pedia e precisava, queria um emprego, então lhe dediquei um tempo que para mim foi um sacrifício, pois já me telefonava de uma Lan House para ajudá-la, era urgente! Porém, era uma armadilha. Na ocasião, uma vez que a mesma já estava decidida a parar de estudar, por isso não precisava mais de mim e nesse caso, jogava toda culpa sobre mim, elaborou uma vingança, ou melhor, exigiu o pagamento da dedicação que tinha me prestado.

    Inúmeras vezes, tenho recebido agressões verbais daqueles a quem devo amar e ensinar, tipo: “Lá vem você de novo”! “Ah, não”! “Êta, professor chato”! “Ninguém merece duas aulas seguidas desse quadrado, antigo”! Dói-me, nem tanto as frases em si, mas o tom das expressões acompanhado com gestos bruscos de repugnância. Tenho essa relação como um lugar escuro, uma espécie de poço, com apenas uma minúscula abertura em cima, por onde entra um pouco de luz que é a esperança de que tudo mude no futuro.

    Quando o colégio, no qual trabalho até hoje, foi incendiado por alunos do mesmo, queimando assim todos os diários de classe, então fui orientado a dar notas: o critério era apelar para sua consciência; como a consciência de cada um trabalha a seu favor, só tiravam notas boas. Nunca tive tantas manifestações de aceitação como naquela época. É possível que esse clima tenha contribuído para minha mudança. Mas, não podemos cometer o crime de dar notas em troca da amizade passageira de alunos transitivos.

    Mas agora, consumindo-me numa “prisão”, acusado de um crime que não cometi: ser apenas velho; eu preciso de amigos verdadeiros. Embora a certeza de que ainda estou sendo útil a sociedade e de que mereço mais respeito e retribuição, é natural que as circunstâncias façam-me suspirar por palavras de encorajamento da parte dos que comigo partilham a esperança bendita do crescimento cultural.

    A maioria dos alunos não é diferente do resto do mundo, essa é o tipo perfeito dos amigos de bons tempos. Enquanto a vida flui serena e tranqüila, com lucro, eles estão por perto. Estão sempre em evidência quando a amizade custa pouco ou nada. Até entram na sala dos professores, tomam talagadas do café que foi comprado com a “vaquinha chorada” que eles jamais colaboraram. Porque, quando a situação se torna crítica e a amizade pode significar algum sacrifício, eles se tornam traidores. Já que eles abominam o papel do professor chato, quadrado e antigo que pelo menos lhes dê a pessoa versátil do professor.

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  2. Seu desabafo não é eco... e você é porta-voz de muitos gritos presos no mesmo timbre...

    Neste sentimento generalizado.

    Katyuscia Carvalho.

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